Uma pesquisa realizada pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP identificou níveis inadequados de iodo em gestantes atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no município. O estudo, conduzido com 266 mulheres, apontou que 38% das participantes apresentavam deficiência do mineral, enquanto 28% registraram consumo acima do recomendado. Apenas 34% estavam com níveis adequados.
O levantamento foi conduzido pela doutoranda Ana Carolina Momentti, do programa de pós-graduação em Nutrição e Metabolismo da FMRP. As concentrações de iodo foram avaliadas por meio de amostras de urina das gestantes. Os dados integram um artigo publicado na revista científica Biological Trace Element Research.
O iodo é um nutriente essencial para a formação dos hormônios da tireoide e, durante a gestação, é fundamental para o desenvolvimento neurológico do feto. A insuficiência pode estar associada a complicações como hipotireoidismo, abortos, parto prematuro e restrição do crescimento intrauterino.
Consumo de sal iodado ainda é insuficiente
Apesar de o Brasil contar com políticas públicas de iodação do sal desde a década de 1950, parte das gestantes ainda não consome a quantidade adequada do mineral. Segundo a pesquisa, fatores como baixa renda, escolaridade reduzida e autodeclaração racial (pretas e pardas) estiveram associados ao menor uso de sal iodado, principal fonte de iodo na alimentação.
O estudo também mostrou que mulheres com maior número de filhos ou intervalos curtos entre gestações apresentam maior risco de deficiência, em razão da alta demanda nutricional.
A ingestão insuficiente está relacionada, ainda, ao consumo elevado de temperos industrializados, que muitas vezes substituem o sal de cozinha nas refeições. Entre as entrevistadas, apenas 20,3% relataram uso regular de sal iodado, enquanto 74,3% declararam utilizar temperos prontos com frequência. O consumo de álcool também foi apontado como fator de risco, com chances 6,59 vezes maiores de deficiência de iodo entre as gestantes que consomem bebidas alcoólicas.
Impactos da deficiência e excesso
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) determina que o sal de cozinha para consumo humano deve conter entre 15 e 45 microgramas de iodo por quilo. Já a recomendação para gestantes é de ingestão diária entre 200 e 250 microgramas. Durante a gravidez, tanto a deficiência quanto o excesso de iodo podem gerar riscos, como parto prematuro, alterações na função tireoidiana da mãe e do bebê, e atrasos no desenvolvimento neurológico.
Alimentos como peixes, frutos do mar, leite e derivados são fontes importantes de iodo, mas o acesso a esses itens é desigual entre as regiões e faixas econômicas. Além disso, a concentração do nutriente varia conforme o solo, o tipo de criação animal, o uso de fertilizantes e até a estação do ano.
Reforço nas políticas públicas e acompanhamento nutricional
A pesquisadora Ana Carolina Momentti destaca a necessidade de revisão nas políticas de fortificação do sal e da ampliação de ações educativas sobre o tema, especialmente entre gestantes. Ela defende a realização de campanhas informativas sobre o uso correto do sal iodado e a importância de hábitos alimentares saudáveis durante a gravidez.
O professor Anderson Marliere Navarro, orientador do estudo e docente da Divisão de Nutrição e Metabolismo da FMRP, avalia que, embora as políticas atuais tenham contribuído para reduzir a deficiência de iodo no país, ainda há lacunas. Segundo ele, seria necessário intensificar a fiscalização da iodação do sal, melhorar as orientações sobre armazenamento adequado e considerar a suplementação específica para gestantes em risco.
A pesquisa terá continuidade com o monitoramento dos bebês nascidos das gestantes avaliadas, acompanhando indicadores de saúde até os seis meses de idade, especialmente entre aqueles cujas mães apresentaram deficiência ou excesso de iodo durante a gestação.